Postagens

Mostrando postagens de 2010

A necessidade

Para além de qualquer silêncio, pretendi ser as intempestivas noites de verão, mas só consegui efetivar as inoportunas tempestades de inverno. Gritei! Gritei muito! Até o ponto de não mais agüentar ouvir minha voz. Como se estivesse a conquistar na força uma luta cujo vencedor levantara o estandarte antes mesmo de eu nascer. Eu tive que perder a voz tentando fazer com que me escutassem, para perceber então que não basta apenas ter boa audição para saber ouvir. Simplesmente porque pessoas de opiniões são, por natureza, surdas. Tornando qualquer empreitada contra essa indagação uma cruzada casmurriana! As opiniões formadas só servem para estagnar as estruturas que todos, sem exceção, reclamam e tentam descartar ou abolir. Desde um ultra-relativista cético até o maior dos ortodoxos religiosos bebem do mesmo cálice sagrado: os dogmas. Em nenhum momento colocamos essas convicções para enfrentar o poder da dúvida. Onde, uma simples conjunção de duas palavras seria capaz de abrir universos de

O retrato da perfeição

Tudo começa no acaso. Num estonteante jogo de sugestões. Onde você decide quando na dança entrar. Você decide... Você define os pares de sapatos que melhor ficam nos seus pés. Preferencialmente aqueles capazes de esconder os dias cansados Você escolhe a melhor camisa branca e o melhor discurso mudo, Mas porque a sensação de insegurança persiste em acompanhar-te? Vai lá garoto! Você tem um belo olhar. O transitar nas amálgamas das contradições Fazem de ti um vaso viril e estonteante, um mancebo de concepções imprudentes. Completo. Não haveria vontade de viver se não pudéssemos passar o portão E você é alto! Terá facilidade em correr caso precise escapar de lá E se as pernas tremerem demasiadamente, vinho lhe recomendaria. Mas, cuidado! Um vaso fica mais bonito depois da terceira doze, O necessário para fazer com que esqueçamos não apenas os medos... Vai lá garoto! Você tem um belo olhar. O transitar nas amálgamas das contradições Fazem de ti um desprovido proscrito de moral, um Canto es

Muito prazer, eu sou o amor.

Sou aquilo que fica escondido no canto da intimidade. O impronunciável, o inaudível, mas nunca o indolor. Teimo em pronunciar-me aos quatro ventos, como os festins de todos os carnavais, mas poucos conseguem ouvir minha obra prima, pois confundem-me com o leviano sabor do entorpecimento. Já fui um encontro de olhar, um pedaço de papel, juras infundadas e promessas de eternidade. Fui o cabo de tormentas, a morte, a dor... A incansável busca por sucesso e os caminhos tortuosos, eu fui para vocês. Fui tanta coisa e muito mais para agradar a todos, até que me esqueceram entre o entretenimento das facilidades. Talvez, eu deva desculpas a mim mesmo por um dia ter feito-me um retrato de facilidades, enquanto a verdade sempre foi evidente:não é fácil. Mas, hoje, enfim, quando o sol dorme no crepuscular do verão, posso afirmar que eu nunca poderia ser quem sou se não fosse o desejo que ultrapassa a pequenez da liberdade ou a facilidade das faltas de escolhas. Muito prazer lágrimas, sou o amor.

A morte da fé

Hoje não devo romantizar o veneno que sinto. Pois ele é tão doce quanto as areais das praias. Sinto o sabor da angustia tomar-me o cotidiano Quebrando as finas camadas da realidade criada. Se pudesse, deixaria de pensar por um segundo, Deixar-me-ia banhar no silêncio dessa anarquia. Dos venenos que guardei para um derradeiro dia Findaram-se todos desde quando li suas palavras, Onde fiquei entre a simplicidade de nossas curvas e o alívio de descansar no aconchego do teu colo. Se pudesse, deixaria de pensar por um segundo, Deixar-me-ia banhar no silêncio dessa anarquia. Hoje não devo concretizar este memorial triste, É véspera de natal é há uma boa nova nascendo Ela não dever ser para mim, sou proscrito da fé Sou aquele que não acredita, e queria acreditar. Se pudesse, deixaria de pensar por um segundo, Deixar-me-ia banhar no silêncio dessa anarquia. Ele não existe, e porque eu sinto doer?

De volta à inocência

Parte 1: a vinda do sem rosto Os dedos tocam o contorno do teu rosto enquanto cultivo o privilégio de perceber o nascer brilho dos olhos recém lavados pelas lágrimas de uma tristeza que se foi Contidos e abafados foram os teus gritos mas nem as cicatrizes da violência vivida foram capazes de impedir que um sorriso alcançasse os teus doces e brasis lábios. Contudo, vejo que rasteiras lembranças teimam em limitar o gesto da felicidade onde os ombros calejados se encolhem em busca da proteção do abraço amigo Sei que sou apenas um rosto disforme ou uma voz inaudível na tua memória. Mas são entre frias linhas que procuro o dia em que um abraço poderei te dar

Ao acordar

Para ver o sol neste dia nublado assumo as cortinas que embrenham o meu amanhecer. Mas já não é mais curto e longínquo o tintilar dos sinos. Chamam-me neste momento. As respostas, porém, continuam engavetadas e perdidas nas brumas do futuro. Restam-me as incertezas. De todo modo, fácil é olhar as cantigas de ontem e pensar que foram providenciais. Elas, em seu tenro e doce sabor, conclamam vitórias e derrotas. Sempre tão distantes... Distantes e irreais. Passado feito de penúria e retratos rasgados. Não me importam aqui. Restam-me as incertezas. O sol dedilha as volúpias dos bordados de desculpas e evidencia o meu corpo desnudo. Neste momento não há como escapar de mim mesmo frente ao espelho. Eu vejo-me! Todas as cores, entre os meus defeitos e os bons feitos, estão a me encarar calmamente. Restam-me as incertezas. Levanto-me! Pois já não há mais como remediar as malvadas peripécias da luz do sol. Os segundos seguintes vestem meu corpo com as armas imaginárias. Estou quase pronto. Bus

O Hino de Seleky

Visto-me com o teu corpo para sentir-me teu Entre suas curvas e palavras, tornam-se os gestos que nunca antes pude vivenciar. Quem és tu? Visto-me com a tua vergonha e meus valores destorcidos de uma vida amarga que inventei. Minhas portas são as fáceis de abrir. Quem és tu? Visto-me com a cruz e palavra. Calúnia! Trago a ti discórdias, dúvidas e mentiras. Trago-lhe a certeza. Quem és tu? Quem és tu, figura translucida, que tateia os mares da minha vil vida? Seria aquele que em palavras fez existir uma amizade rasteira, cujo mérito teria sido um simples jogo de cartas? Seria, talvez, um pouco de cada um. Das tuas histórias... Dos teus alter egos sórdidos, enraizados na imaginação doente de uma alma já morta? Ser ausente de si. Triste... Amargurado... Eu senti o sabor das tuas lágrimas quando zombou da ingenuidade de um amigo. Mas sei que elas foram bem menos ácidas do que aquelas que provou quando teve que aceitar o óbvio. Eu sei quem és tu. Mas, isso não importa, afinal, a pergunta

Má Lembrança

Impeto rumbor de uma dor que consome o septo desta alma sendo incapaz de impedir que o amargo dos dias quebrados assombre os findos resquícios de saudades, e ali armados de descomunal tristeza, emolduram os vícios nesta forma. Os dias calangueiam as frescuras e dissipam meu destino, enquanto o sol teima em demonstrar as virtudes das vidas entre as frestas da janela do meu quarto escuro de feridas, porém a sofreguidão envenenou o que antes era cristalino. Pode ser que seja mais uma confusa temporada de inverno ou uma marola a fluminar meus pecados de outros veraneios mas, por hora, finjo não acreditar em nada que seja eterno Pois, pode ser que tudo seja nada e aquilo que nos é herança se transforme em desilusão e promessas infundadas de terror. E por fim, perceber que sou para ti apenas uma má lembrança.

Quase

Onde eu posso reconhecer o teu sorriso, se ele não se forma para mim, Onde está aquele azul só nosso, nossos sonhos de irmos até a Grécia? Como devo pensar no meu dia e deixar o futuro ser apenas suposição, Como devo, melhor dizendo, ser o hoje se o amanhã ainda são brumas? Preciso aprender a domar os desejos ou sou alguma face da perdição, Preciso ensinar ao meu coração a não percorrer o caminho impossível? Seja como for, o dia é vivido, mas importa-me o como ele é tido Seja como for, nas curvas contraditórias e incertezas da vida... ..eu te amo...

O Diário de Teegoh – Semana 34

Devo admitir que ela não figura as apelações do inferno. Mais parece um pônei de circo, que entre sua educação primorosa e suas plumas e enfeites, ela deve ser um pouco acima de um espetáculo programado. Tão pacíficos são seus gestos que assustar-me-ia vê-la revoltada com algo. Ela nasceu para ser domada, seja pelo pai, pelos irmãos, e agora, pelo futuro marido. Confesso que isso não é de todo ruim. Para mim. Não reconheço a menina que um dia as sardas do rosto foram-me motivos suficientes para enterrar a alma dela entre minhas chacotas. Hoje, ela é tão refinada que talvez não haja mais lágrimas em seus olhos, ou então, todas elas já se foram. Derramadas. Por outro lado, não reconheço minha mãe, apesar de seu gosto peculiar por grandes vestidos continuar o mesmo. Ela, de algum modo, esta espremida entre os medos das incertezas políticas e as rugas em seu rosto. Por um segundo, apesar de discordar veemente das suas atitudes, eu a compreendo. Por fim, difícil não é saber o que é o certo,

O menino que sabia das coisas (Epílogo)

As notícias do dia seguinte não se associaram nem com as plumas nem com as palavras que voaram pelos céus da cidade naquele mês. Um suicídio. Era apenas isso. Culpavam os país, a sociedade, o mundo violento... Todo mundo buscou o dedo que empurrara o garoto para a morte. Mas ninguém entendeu o que aconteceu. Ninguém tampouco questionou-se sobre as possibilidades. Afinal, vivemos em uma sociedade onde há uma tampa para cada caixa. Cada ato é prescrito e um cristão sabe onde o bem vive e sabe principalmente onde o mal de cada um vive. Uma ou duas semanas foi o tempo necessário para cidade esquecer o acontecido. Isso, para os mais sensíveis, pois no dia seguinte a crise econômica estourou e todos estavam preocupados com seus bolsos. O garoto morreu tentando trazer a alegria do mundo. Ele conseguiu por um instante, mas as pessoas estão tão desesperadas e ainda são crianças do mundo, a aprender o banal. Elas erram, como eu. Julgamos e condenamos. E assim, matamos não apenas o corpo, mas a e

O Diário de Teegoh – Semana 33

Como posso casar-me com alguém que nunca vi na vida? Lembro-me daquela lânguida menina a me visitar nas férias... uma triste filha de nome farto das terras do além-mar. Raios! Não posso desposá-la simplesmente porque minha mãe tem um acordo com o pai da sortuda! Não! Não é que eu não possa... eu não QUERO! Mas, deixe vir... minha tão caridosa mãe chegará daqui dois dias... Hei de convencê-la que tal congruência não é digna mais, afinal vivemos no século XX! Enfim... para formar este teatro, meus colegas de classe estão a me irritar com este assunto. Estão a me chamar de “o sortuno” ou “o afortunado”... não acredito na sorte, do modo como eles a descrevem... bastardos!!

O menino que sabia das coisas (parte 3)

Ele não se conformou ao ler as noticias no jornal do dia seguinte. Compararam o ato do vôo das palavras com a censura e a queima dos livros nos períodos de ditadura no mundo. O garoto concluiu que ninguém deve ter lido as palavras recortadas, foi quando uma tristeza imensa tomou conta de seu coração. Mas, como toda tristeza há sempre uma grande esperança, o garoto entendeu o seu erro e logo buscou formas para continuar mandando alegria para as pessoas. Nesta busca, não foram necessárias mais do que uma noite não dormida para que o garoto encontrasse a solução. Como em uma conta de comparar as diferenças, ele repassou mentalmente o primeiro e segundo ato em busca da alegria. Ele era inteligente. Ele era solitário. No entardecer do dia seguinte. Um pedaço de madeira afixado no telhado de um dos prédios estava móvel e o ajudou a montar uma estreita ponte entre os dois prédios. Ele sabia o que fazer, e assim o fez. Com a mesma faca que apunhalou o travesseiro, ele viu que o grande propulso

O Diário de Teegoh – Semana 32

Semana passada, ainda disse em tom jocoso que para casar-me a mulher teria que ser quase que uma estátua. Questionaram-me os motivos para tal apelação com a vida. Disse que morreremos sozinhos, sem exceção, portanto qualquer busca por segurança não seria produtiva e que casamentos nada mais eram que acordos desesperados entre as pessoas para buscar um falso conforto. Evidentemente, ninguém concordou comigo e questionaram-me sobre o amor e sobre as demais coisas do gênero... Eu não quis mais discutir, pois percebi que eles não sabiam o que era o amor ou aquilo que eu sei ser amor é algo que ainda não foi alcançado por eles. Meus colegas de classe são toleráveis, contudo. Apesar de mais parecerem peças pré-moldadas de gente. Sinto-me confortável com eles, eles são divertidos e não toleram algumas das coisas que eu não tolero também e, por mais que me sinto como se estivéssemos vivendo em planetas diferentes, há uma tolerável proximidade entre nós. Às vezes, sinto falta de ter alguém que

O menino que sabia das coisas (parte 2)

No dia seguinte, o garoto leu no jornal da cidade uma pequena crônica sobre o acontecido. Suas plumas inspiraram a poesia em trechos corridos das folhas do dia. Ele sentiu que sua missão que nunca aceitara foi concluída. Ele não sabia, mas naquele momento ele teve um poder muito grande em suas mãos. Foi então que ele decidiu ir à biblioteca do colégio. Foram dias e dias entre os clássicos da literatura. O garoto consumia as obras desvairadamente, sem perceber as sensações de seu próprio corpo. Ele estava no estado de nirvana. Ele era um anjo, mas não sabia disso. Um anjo que não entendera a situação do mundo, tampouco a situação das pessoas. Pessoas desesperadas por amor, que cometem os erros mais cruéis ao tentarem serem correspondidas... Ele apenas estava feliz e com vontade de fazer algo a mais. Após duas semanas, o garoto recortara tantas frases dos livros que aquela biblioteca iria ficar conhecida no futuro como o lugar dos textos sem belas mensagens. Todas estavam nas mãos do peq

O Diário de Teegoh – Semana 31

Viver em Paris é esquecer as origens. Esta cidade cheira à boemia e a erudição. Busco ambos. Mas, nem sempre é fácil guardar as roupas de uma guerra. Por mais que elas fiquem no fundo de um baú, há sempre a sensação do se poder sentir o cheiro de lama e sangue impregnado em suas ancas. Mas, a imagem de um pesadelo não se consiste nas lembranças dos cheiros. Ela se forma naqueles que continuam a andar e usam os melhores perfumes. Os olhos de Tobias brincam com minha sorte ao julgar-me impiedosamente. Contudo, hoje o dia está mais para atitudes do que para lembranças. Porém o olhar daquela menina no quadro é perturbador também. Hoje não mais sei se é de fato uma menina ou um garoto. Ela (ou ele) é um tanto quanto andrógino... parece um anjo, que avistou a morte... Frente a morte, somos todos iguais. Somos todos iguais mesmo? Somos talvez todos iguais por sermos todos diferentes. Enfim, fazia tempo que não me sentia instigado a desvendar um olhar... isso, na verdade, só aconteceu uma vez.

O menino que sabia das coisas (parte 1)

Era uma vez um garoto, um pequeno e solitário garoto que vivia em dois apartamentos, nos dois maiores prédios da cidade. Seus pais, divorciados, mantinham uma guerra fria pessoal, onde ambos disputavam a atenção um do outro através do poder aquisitivo. Enquanto isso, o menino crescia... Ele, é fato, não perguntava os motivos para estar vivo ou os porquês das silenciosas brigas entre as pessoas. Ele simplesmente vivia. Um dia, ele decidiu subir até o teto de um dos prédios onde morava. Lá, ele sentia o vento frio tocar seu rosto enquanto ouvia os ecos de uma sociedade caótica aos seus pés. Mas, ele não percebia nem uma coisa, nem outra. Ele apenas vivia entre seus olhos azuis e a uma falta de vontade para tudo. Naquele dia, o menino descobriu a beleza do vôo de objetos mortos e decidiu construir a alegria de todas as pessoas. Ele então pegou uma faca que trouxera entre outras poucas coisas e, com um golpe preciso apunhalou seu travesseiro. Aos poucos, o vento gélido que tocava sua pele

O Diário de Teegoh – Semana 30

Essa semana o zelador da ala de alojamentos onde eu habito morreu de um ataque no coração. Este até então quase moribundo senhor, que em suas pernas tortas a mancar para lá e para cá o tempo todo, mal conseguia manter-se em pé. Às vezes ele me perguntava sobre as cores das roupas intimas das alunas ou então se eu tinha algum cigarro para passar-lhe. Um típico senhor solitário que gostava de conversar comigo e mais outros tantos alunos... Não entendo, contudo, os motivos que o levaram a deixar justamente para mim tal presente. Ah, e é evidente que ele sabia da visita da morte, pois deixara cada um de seus míseros resquícios materiais como presentes, embrulhados e amarrados com fitas coloridas. Um olhar penetrante, contudo plácido, como se soubesse o que lhe esperava logo à frente. Uma guerreira em forma de menina na neve. Tão branca... parece morta. Congelada. Seu sorriso talvez mais enigmático do que o da própria Mona lisa, parece espraiar-se frente ao incontestável destino da imorta

Truques para viver

Foi o reconhecimento ou a monotonia urbana que moldou assim a condição dos homens? Espero que este fluido ratoneiro de devastação não cumpra o dever de seus dias prometidos... Não gostaria de perder as minhas esperanças. É o que me resta por aqui, além da solidão. De todo modo, há ainda algo a se considerar: Eu ainda posso ver as mãos da vida em mim. Como pudemos nos perder dessa forma? E eu que pensei que cantávamos juntos... Pensei que nesta brincadeira e contradições fossemos os melhores domadores de leões... Mas tudo bem. Tudo deve ficar bem um dia. Eu espero que este pássaro voe para longe. Talvez, em outros tempos e outras terras, poderemos juntos andar novamente. Como nossa graça pôde desvanecer desse modo? Ao menos, aprendemos muito no caminho. Eu deixei o jantar de restos pronto para a noite. Mas o entardecer toca meus sonhos em azul. Você conseguiu tirar-me do meu castelo do céu. Você ouviu minhas idéias e sorriu pra mim. Mas eu sabia que minhas pernas eram frágeis E talvez e

Entre...

Talvez eu nunca encontre os teus defeitos debaixo da ponte. Porque renasci enquanto caminhávamos juntos, nos sonhos. Porque descobri o refúgio dessa insuportável sociedade-paz. Mas, tudo bem! Um passo de cada vez... afinal, eu já cai. Estou no chão mais uma vez e nada mais quero pensar. Mas, tudo bem! Um passo de cada vez... devia assim ser. Estou no chão e desta vez pode ser que eu fique por aqui. Talvez eu não realize os meus desejos mais íntimos por aqui. Porque parece que o meu tempo não é contato nos segundos. Porque sou dono de um mundo que ninguém quer morar. Nem eu... Talvez eu tenha me enganado sobre a textura dos teus beijos. Porque não encontrei lembranças ternas na minha cabeça. Porque sentimento sem troca é saudade de quem se foi. Mas, tudo bem! Não poderia existir o nós, por aqui. Estou cansado de dançar esta música sozinho. Mas, tudo bem! Não pode existir nada além do eu. Estou cansado de segurar todos os lados do laço. Talvez eu renasça outra vez e aprendo a andar de pa

O Diário de Teegoh – Semana 29

As noites de Paris estão mais agradáveis nessa época do ano, principalmente por Tobias não mais estar tão presente. Não me irrito facilmente, eu apenas estava um pouco indisposto com as loucuras daquele jovem. De todo modo devo procurá-lo, afinal, neste mundo, é melhor conviver com os loucos genuínos do que com os mascarados de Veneza. Além disso, não tenho ao certo qual seria o prazer da loucura daquele rapaz e não quero que minhas ancas sejam devoradas desprevenidamente. É curioso contudo como fantasmas gostam vir me visitar! Há duas noites sonhei que Pierre estava sentado debaixo de uma árvore de um parque qualquer. Deste sonho lembro-me perfeitamente do cheiro das rosas daquela imensa roseira. Mas, ao me aproximar, vi que tais rosas eram vermelhas pois suas raízes se alimentavam do sangue do rapaz, esturricado, em sono profundo... Será a morte sugadora de sangue, como um vampiro? Ao menos o fim parece ser menos melancólico se transformado em rosas tão vivas.

O contador de Histórias

Posso imaginar a loucura dos seus atos desenhando-se em frente à tua incapacidade de agir. É fácil fazer da minha imagem o personagem principal do seu romance de horrores. Eu posso ser o teu vilão, mas isso não passa do reflexo da tua insanidade. Sou aquele que você nunca tocará, pois o meu cheiro, perto do teu apodrece entre tantas mentiras e tantas histórias. Porém, você não é um contador de histórias... é apenas um ser apaixonado, solitário e absurdamente carente. Fico neste pedestal que você construiu pra mim, enquanto percebo você se afogar dentro de você mesmo. O jogo vira. Ganha outra cara. Você não consegue controlar e isso te desespera. Não sou uma pessoa má. Nem sou eu que conto a ti essas palavras. Sou a sua consciência que adormeceu nesta noite. Enquanto você brinca de cavar minha cova. Enterrar-me ainda é fácil, afinal, não estou muito acima do peso. Mas você viverá bem enquanto eu por lá estiver. Isso é o que importa. Portanto, divirta-se!

O Diário de Teegoh – Semana 28

Uma semana conturbada, posso dizer. Perturbador, em última instância, tem sido perceber a serenidade dando seu posto para a loucura e autodestruição. Temo, mas não muito, que essa crise reverbere gotículas em mim. Tobias é um rapaz que poderia aproveitar mais do vinho e menos da loucura pessoal. Ainda mais estando em Paris. De todo modo, não saberia descrever como eu o vejo ou o que posso esperar dele. Essa semana eu li algo sobre a Lilith de Lucius Apuleius . Curioso esse livro vir a mim neste momento. É uma pena, contudo, eu não acreditar em destino, nem em bruxas. De outro modo, poderia deliciar-me com um suspense fantasioso. Mesmo assim, essa foi uma semana atípica, no modo como perdi-me entre os devaneios de Tobias. Isso acabara neste instante. Pois temo ser o absinto dele diferente do meu.

O gosto da descoberta

Era simples. Um coagulo de sangue estancado há anos. Com vida, porém quente: porém adormecido. Apenas esperando. Esperando... Até que o dia nasce. Ele acende aquilo que lhe faltava, como um milagre. Ele conhece o sabor da terra, o tenro gosto do ar a tocar os lábios. Já não era ele apenas uma gota... O céu deu a chuva, que fez as corredeiras de fertilidade e amor, e assim se formou o barro. O homem pouco a pouco se desenhou contando com a gentileza do toque. Esculpiram-se os arredores do desejo em torno de um torço firme. O corpo era imaculado e portava todas as virtudes. Nenhum vício. O sol trouxe a beleza das cores e os cachos dos seus cabelos tornaram-se brilhosos. Enquanto, como uma floresta, o corpo em pelo, explorava suas inconstâncias. Mas o despertar do dia trouxe também o outro, que não era tão belo, nem tão sábio, tampouco puro. Era o dia em que a virtude se banharia no sabor do vinho de baco. E seja ele Adão, David, Sebastião ou Jesus... Sua pele enrijecia em virilidade e su

O Diário de Teegoh – Semana 27

A obsessão de alguns pela dor impalpável é algo lastimável. Enquanto deito-me na bonança dos dias, entre o fastio e os vícios, Tobias especula cada segundo na tentativa de escapar-se dos fantasmas do arrependimento que ele mesmo criou. Acostumei gastar algumas horas do meu dia com ele, contudo. Mas, algo me inquieta ao olhar dentro daquelas esmeraldas em forma de olhos. A sanidade esta mediando um equilíbrio delicado dentro naquele rapaz. Queria sentir pena. Mas, de todas as marcas e buracos escavados em corpos que já vi, nada é mais espantoso e evasivo que aqueles olhos verdes. Mesmo assim, não sinto repulsa. Os dias correm rápidos por aqui desde que Tobias chegou.

Minha mestra

Não acredite no equilíbrio. Simplesmente porque ele não existe! Pode ser que haja um conflito de tensões divergentes que se findam na sensação de equidade, contudo, como já dito, isso seria apenas uma sensação. Mesmo em um jogo, onde você tem o mesmo número de peças ou cartas que seu adversário e que as regras sejam aplicadas da mesma forma para todos os lado, ou seja, um terreno limpo de qualquer vantagem: isso é Ilusão! Haverá sempre aquele que tem mais experiência que você, ou menos pretensão. Há quem sonhe e é petulantemente abusado! Há quem reze ou quem chore. Há quem seja o contrário ou tudo isso e tantas outras contradições. Pois, em um jogo, não há ponto zero. Não se descarta as memórias ou as promessas não cumpridas. Enquanto hoje, você se sente o dono do mundo, amanhã eu sou o coringa que te joga pelo avesso. Psicologicamente. Mas, coabitar com a finitude não é de todo ruim. Pode impulsionar. Pode ser brinquedo e pode-se manipular ao seu gosto. Às vezes funciona. Às vezes não

O Diário de Teegoh – Semana 26

Nunca pensei que o mundo fosse um lugar grande. Mas, eu ainda achava que haveriam lugares anônimos o suficiente para só cruzarmos com olhos nunca vistos antes. Porém, momentos como este que contarei fazem com que eu me perceba tão insolente e ingênuo. Naquela tarde banal, enquanto tomava um café banal, em um lugar banal, eu escrevia neste caderno. Eis que avisto um rapaz dirigindo-se à minha direção. Entendi as nuanças de Manet neste instante. Mas, a imagem a se formar não conferia com as paisagens bucólicas do pintor. Estou em Paris. O que deveria eu esperar? Nunca mais ver os rostos ou os fantasmas de além-mar? Paris é a casa de formação para os burgueses de lá! Quando não, é a casa de campo, o jardim de inverno ou qualquer outra banalidade! Quantas banalidades! Há muito tempo não sentia o meu coração acelerar. Lá estava ele... tão real! Não soube por um raro momento se levantava e corria naquela direção ou para uma oposta. Permaneci sentado. Plácido. Ele sentou-se na cadeira à minha

Um dia...

Imagem

O Diário de Teegoh – Semana 25

Termino essa semana sem quaisquer novas. Essa terra, de tão atrativa, torna-se enfadonha e previsível. Até as cores do céu são previsíveis... Invejo os poetas, por serem capazes de fantasiar de modo tão convincente. Pior! São capazes de criar! São deuses proscritos! Divirto-me mais com essas folhas e letras em preto do que com as ideologias da mocidade. Será que sou um velho em corpo maculado? Sinto-me que devo parar de escrever, pois algo insano em minhas palavras começa a ganhar contorno. É estranho perceber que percebo os mecanismos de modo diferente. E, por saber que é diferente, torno-me diferente também no modo de agir e guiar as convenções sociais. Cada dia que passa, sinto-me como que os meses passados foram apenas sonhos bizarros de realidade. Por aqui, nem notícias nos jornais sobre o lado de lá se lê. Um mundo a parte... terrinha de [este texto parece ter sido interrompido bruscamente. Adiantamos que os motivos para tal afirmação poderão ser facilmente percebidos com a leitu

Ao Espelho

Você vê o que causa a dor da não consumação. Você sabe que tua aflição, com o passar dos meses e anos, transforma-se num tênue desconforto. Quase imperceptível. O corpo sabe se proteger das dores. Ele cria armadilhas para si mesmo. Ele se afasta dos espelhos para não enxergar a ferida exposta. As feridas são ungidas em perfumes ralos, para escapar dos odores da insatisfação. Mas, se uma foto, uma palavra, um gesto ou um mísero pensamento que seja, tocar o teu dia por um segundo, perceberá então que mesmo nada sendo como um dia fora, mantém ainda em ti o desejo por um gesto de carinho. Então, desfalece um momento. Contêm as lágrimas. Veste qualquer coisa e se vai.

O Diário de Teegoh – Semana 24

Ao chegar à Paris deixei para os quinhões do além mar a idéia de liberdade. Tampouco reconheço o significado do amor, como algo palpável. Igualdade... é tão irreal que recuso-me ousar firmar algo, mesmo que seja o contrário do real. Paradoxalmente minha cama fica na terra-mãe dessas palavras... Palavras, que, por sua vez, são cantos na boemia dos bordeis infestados de gente e de sexo. Posso dizer, contudo, que hoje conheço algumas pessoas que atravessaram a barreira da mediocridade, mesmo sendo eles quase zumbis de histórias encantadas: histórias de amor. Mas nada mais agradável como companhia para beber os dias e as noites do que pessoas e suas histórias... Demonstro que cada vontade vale menos que as taças de vinhos que tomamos, e brindamos. Eles me chamam de “amer” nas noites de boemia... Nada mais coerente, contudo! Até que gostei, por um segundo... afinal para alguns quando percebem que não existe “aimer” só lhes restam o “amer”... No fundo, sou o espelho da ilusão de cada um, sin

26

A sensação, ao fechar a porta, era quase delinqüente. O furor da rua se calava instantaneamente e os cachorros não latiam mais. Deleitei-me nos segundos seguintes ao tirar meu calçado calmamente. Senti o cheiro da minha casa, mesmo confundindo-o com o cheiro da terra molhada do lado de fora. Cheguei um dia a pensar que minha história demoraria apenas 16 anos. Hoje, a casa dos 20 ultrapassa a alvorada do meio e dedilha em mim mesmo a sensação da jovialidade quase esquecida. Posso dizer que sou os cacos de tantas histórias, sendo que hoje administro um quinhão delas, sempre me perdendo, mesclando-me à coisas insanas e alheias à mim. Mas, a delicia ao abrigar-me no silêncio desses segundos só não é maior que a sensação de aconchego espalhado sobre minha cama. Essa mensagem talvez não faça sentido... de fato, não é para ter sentido, pois, por um momento esqueço-me dos amores impossíveis, das mazelas do mundo e da incoerência... Apenas deleito-me em um ato explicitamente egoísta no gesto do

O Diário de Teegoh – Semana 23

Entre as grossas e seculares paredes, divido meus dias entre os afazeres da universidade e os poucos livros que ainda suporto ler. Debruço-me mais nas memórias que colho durante as visitas ao Louvre, enquanto meu colega de quarto baba em seu travesseiro. Não me preocupo mais onde guardar este meu caderno, pois cá, tenho a ignorância alheia a meu favor, é apenas uma questão de manter a escrita em minha língua vernácula. Lembrei-me do gosto das francesas em algumas das noites que antecederam esta. Tão delicadas e pequenas... alvas, de sabor levemente azedo e adocicado. Tão versáteis e fáceis! Fúteis! Finjo-me divertir enquanto elas fingem me amar. No fundo, é tão justo quanto a liberdade: ambas são doces encargos de falsas idéias, ou idéias impossíveis. Mas, enquanto respirarem e carregarem o fugaz prazer do sexo farto, hão de sentir a paixão furtiva e o gesto de uma ilusão qualquer. De todo modo, são essas ações que fazem do meu tempo ser menos que as badaladas da exausta Notre Dame.